Do baú das conversas com as minhas filhas
No outro dia em conversa com uma amiga que se queixava das coisas “más” que a filha de quatro anos e meio lhe diz quando se chateia com ela ou quando tem de lhe impor regras, lembrei-me de um dos muitos momentos com a minha filha mais velha.
Dizia-me a minha amiga que no auge de uma birra a filha lhe disse: “Qualquer dia vou-me embora desta casa”. E eu lembrei-me.
Estávamos a ter uma discussão, eu e a Sara, não me lembro sobre o quê, quando a pirralha, para aí com uns três anos se virou para mim, toda decidida e diz: “Quero-me ir embora desta casa”.
“Queres? Está bem. Anda lá que eu ajudo-te a fazer a mala. Vais para onde?”, perguntei-lhe.
“Vou para casa da avó”, que morava no andar de baixo, respondeu, toda cheia de estilo.
“Não, para casa da avó não pode ser, que a avó não pode ficar lá contigo, tens de ir para outro sítio qualquer”, fui-lhe dizendo enquanto lhe metia umas roupas numa mochila.
Abri-lhe a porta, dei-lhe a mochila e um beijinho e fiquei a vê-la a descer a escada, a olhar por cima do ombro para ver se eu a estava a ver ou se ia atrás dela. Fui-lhe dizendo adeus e quando ela acabou de descer a escada desci também para ver até onde ela ia. Ainda pôs a mão no puxador do portão para o abrir, mas depois começou a vacilar, sentou-se no degrau a fazer beicinho, com ar de quem não sabia muito bem o que fazer à vida.
Cheguei ao pé dela e disse-lhe: “Então não ias embora?”.
Pensam que ela deu o bracinho a torcer? Nem pensar nisso ou não fosse ela minha filha: “Acho que vou só amanhã. Esqueci-me de umas coisas…”.
Voltámos para casa, desfizemos a mochila e nunca mais falámos no assunto, mas também nunca mais me ameaçou que fugia de casa. Deve ter ficado a pensar no caso.